Por Tiago C. Soares | Comunicação FPA
O papel dos blogs e das novas tecnologias de comunicação na mídia e na participação popular foram temas centrais do 1º Encontro Mundial de Blogueiros, que reuniu em Foz do Iguaçu, nos dias 27, 28 e 29 de outubro, ativistas, pesquisadores, jornalistas e representantes de partidos e dos movimentos sociais do Brasil e do exterior.
O evento, que entre palestrantes e espectadores contou com mais de 400 pessoas vindas de países das Américas Latina e do Norte, da Europa e da África, foi organizado pelo Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé e pela Altercom (Associação Brasileira de Empresas e Empreendedores da Comunicação), e tratou de temas como democracia participativa, democratização dos meios de comunicação e marco regulatório, e circulação de informação nas redes sociais, com especial atenção às novas formas de ativismo oferecidas pela web.
Com mesas organizadas nos eixos “O papel das novas mídias”, “Experiências nos EUA e Europa”, “Experiências na Ásia e África”, “Experiências na América Latina”, “As experiências no Brasil”, e “A luta pela liberdade de expressão e pela democratização da comunicação”, o encontro trouxe representantes de projetos como Wikileaks, Página 12, Le Monde Diplomatique e Democracy Now. As mesas contaram, ainda, com ativistas digitais envolvidos nas mobilizações da Primavera Árabe, analistas políticos, acadêmicos e representantes de governos da América Latina.
Abrindo o encontro, a mesa “O papel das novas mídias” uniu o porta-voz do WikiLeaks, Kristinn Hrafnsson; o criador do Le Monde Diplomatique, Ignácio Ramonet; e o jornalista e blogueiro brasileiro Luis Nassif num debate sobre as novas plataformas de comunicação online e as mudanças vividas pelo universo da informação.
Pelo Wikileaks, Krinstin Hrafnssson falou das recentes dificuldades vividas pelo projeto - que teve seus fundos bloqueados por grandes empresas financeiras - e apontou no governo dos EUA um dos responsáveis pela perseguição sofrida pelo site. Hrafnsson explicou ainda os motivos pelos quais o Wikileaks teria rompido sua parceria com alguns veículos de mídia tradicionais, afirmando que “alguns jornais veem no Wikileaks apenas uma fonte de conteúdo bruto, e não aceitam o fato de termos, também, interesse editorial no modo como são divulgados os conteúdos que levantamos”. Ele lembrou que, em sua opinião, a emergência do Wikileaks tem a ver com a queda, junto ao público, na credibilidade das informações veiculadas pela grande mídia. “Nos últimos dez anos intensificou-se a falta de transparência nas informações relativas a governos e corporações”, argumentou.
Em seguida, Ignácio Ramonet, do Le Monde Diplomatique, propôs uma análise conjuntural do momento vivido pela comunicação de massa com o surgimento, nos anos recentes, de novas plataformas para a participação dos cidadãos na produção da informação. “Estamos em meio à mudança, daqui a cinco anos o cenário da mídia de massas estará completamente mudado e não temos como saber para onde isso apontará”, disse Ramonet, que justificou seu diagnóstico lembrando da crise financeira e editorial hoje enfrentada pelos grandes meios de comunicação.
Ramonet lembrou também que a queda de alguns grupos de mídia tradicionais não significaria a princípio uma mudança na correlação de forças no mercado da comunicação. “Há o surgimento de novos atores centrais, grupos econômicos que lucram com a produção de informação na internet. Empresas que fazem sua riqueza com a informação trocada pelo público em suas plataformas”, argumentou. E lembrou: “O acesso do público à informação primária levou à criação de um novo proletariado, mercenariado da comunicação”. Para o criador do Le Monde Diplomatique, o amplo acesso às novas ferramentas de comunicação não necessariamente significa uma postura menos conservadora de novos atores: “há blogueiros rebeldes e há os reacionários, precisamos ser cuidados são atribuir à blogosfera no geral um papel progressista”, afirmou.
Encerrando a mesa, o jornalista Luis Nassif tratou da relação entre mídia e capital financeiro no Brasil, enfatizando o papel da blogosfera no agendamento da opinião pública e na desconstrução de pautas e interesses dos meios de comunicação tradicionais.
Como exemplo, Nassif lembrou do papel da blogosfera no debate público no período do caso Satiagraha. “A mídia jogou seu poder para atacar a operação e defender Daniel Dantas e Gilmar Mendes. O contraponto foi na blogosfera, que respondeu, ponto por ponto, as inverdades levantadas pela mídia, com informações”. O jornalista disse acreditar na criação de novos espaços para a mediação e circulação do conteúdo circulado online, em redes para a checagem e levantamento de dados e informações que sirvam de contrapeso para o oferecido pela mídia tradicional.
Ativismo e redes sociais
O evento continuou com a mesa “Experiências nos EUA e Europa”, que reuniu Pascual Serrano, blogueiro e fundador do sítio Rebelión, da Espanha; e Andrés Thomas Conteris, fundador da versão em espanhol do site Democracy Now, dos EUA.
Pascual Serrano traçou um breve histórico da apropriação das novas ferramentas digitais pelos veículos independentes, oferecendo uma análise crítica da relação entre o ativismo e a mobilização nas novas redes digitais.
“Na década passada e no início desta década foram os jornalistas alternativos os que apostaram inicialmente nas possibilidades da internet”, disse Serrano -- cujo site, o Rebelión.org, foi criado em 1996. Ele repassou ainda os diferentes momentos vividos pela internet nas últimas décadas, passando pela criação do Youtube (marco que teria deslocado a linguagem online para o audiovisual) e a emergência das redes sociais (que teria dado aos jovens a frente do processo que chamou de “ativismo informático”).
O criador do Rebelión vê com desconfiança as novas mobilizações articuladas por ativistas digitais (ações como os Indignados, na Espanha, e o Occupy Wall Street, nos EUA) e não as vê como ações capazes de criar transformações profundas. Para Serrano, ao aumentar a velocidade e a concisão nas práticas de comunicação, os blogs e redes sociais inibiriam reflexões mais profundas.
Num contraponto, Andrés Thomas Conteris tratou com entusiasmo das novas manifestações políticas organizadas em rede por ativistas ao redor do mundo. Conteris lembrou do amplo apoio popular e da espontaneidade na articulação dos movimentos relacionados ao ativismo digital, enfatizando acreditar que essas ações surgem como uma tentativa de mobilização permanente. “É a mensagem de insatisfação dos 99%”, afirmou, numa referência à maioria que vem sofrendo os efeitos da crise econômica causada pela população dos 1% mais ricos do planeta.
Ao fim do primeiro dia, a experiência da primavera árabe e o cenário político do Oriente Média foram o tema do debate “Experiências na Ásia e África”, que contou com os ativistas Ahmed Bahgat (Egito), Ahmed Alohan (Arábia Saudita) e Muhammad Farhan (Paquistão), além do jornalista especialista em assuntos da região Pepe Escobar.
Os ativistas trataram das estratégias de mobilização e contra-informação postas em prática nas manifestações populares organizadas em rede em seus países. Eles trataram, ainda, das dificuldades sofridas na divulgaçãode de suas ações nos veículos de mídia tradicionais, que promovem o sistemático boicote de notícias sobre as manifestações civis promovidas nos últimos tempos. Foi lembrado, também, o papel central de redes sociais como o Facebook na organização e circulação de informações e na mobilização do público.
A fala dos ciberativistas foi complementada pela exposição do jornalista Pepe Escobar. Correspondente doAsia Times e da Al Jazeera, Pepe traçou um breve histórico dos conflitos pelo poder na região Oriente Médio e no norte da África no século XX. Trecho da fala de Escobar pode ser vista no video abaixo.
Um comentário:
Olá, Odisséia . Eu não fui , mas gravei esse vídeo que está em todos os sites e blogs de esquerda do país.
Uma verdadeira aula do Pepe Escobar sobre a realidade política da Líbia .
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